A irrestrita liberdade de imprensa de que se goza hoje no Brasil deve ser defendida por todos os brasileiros, independente de sua posição política. Literalmente qualquer coisa pode ser dita sem impedimento prévio no Brasil, e a mastodôntica coleção de mentiras, injúrias, calúnias, difamações, distorções e manipulações veiculadas regularmente por Veja, Globo, Folha, Estadão, Zero Hora e outros oferece a prova cabal de que vivemos em pleno exercício desta liberdade.
Muitos brasileiros, ainda escaldados pelas ditaduras, confundem a “censura” com qualquer reclamo de responsabilização sobre o dito. Uns poucos brasileiros ligados à grande mídia manipulam de má fé essa confusão em benefício próprio. Na verdade, todas as democracias que asseguram a plena liberdade de expressão (a total ausência de censura prévia) possuem em comum, em seu arcabouço jurídico, alguma forma de penalização sobre o difamar e o caluniar. Essas leis são parte do que garante a plena liberdade de expressão. O problema no Brasil é que só os poderosos têm podido recorrer à justiça evocando-as, e em geral para silenciar vozes discordantes.
A liberdade de imprensa não está realizada em todo o seu potencial se apenas meia dúzia de famílias dela usufruem de forma massiva. Neste sentido, o grande obstáculo para a plena democratização da imprensa no Brasil (que avançou em função das novas tecnologias e algumas políticas do governo Lula) é justamente a mídia monopolista das famílias, que se agarram aos seus velhos privilégios com enraivado, baboso rancor.
Não há liberdade plena de imprensa sem direito de resposta, o direito de expressão mais desrespeitado, historicamente, no Brasil. No entanto, vivemos num País cujo maior jornal publica ficha policial falsa, adulterada, com falsa acusação, sobre o passado de uma ministra, e nem mesmo ela consegue exercer seu direito de resposta. Caso ela tivesse cometido o erro político de buscar judicialmente o exercício desse direito, teria sido insuportável a gritaria histérica dos funcionários das famílias contra uma inexistente “censura”. É preciso que cada vez mais a sociedade civil diga a esses grupos de mídia: vocês não têm autoridade moral para falar em liberdade de imprensa nenhuma, pois apoiaram a instalação dos regimes que mais atentaram contra ela, além de que não a exercem em seu próprio quintal, negando sempre o espaço de resposta a quem atacam.
A discussão democrática sobre a renovação (ou não) das concessões públicas a rádios e TVs não é contraditória com a liberdade de imprensa; pelo contrário, é parte de seu pleno exercício. No Brasil, a discussão democrática sobre as concessões é de particular importância no caso do único grande império de mídia que sobrevive com poder de fogo, o da família Marinho, de tão nebulosa história.
A liberdade de imprensa inclui, como componente essencial e inalienável, a liberdade de exibir, ridicularizar, parodiar, mentir, e distorcer a própria imprensa. Hoje, no Brasil, nove de cada dez gritinhos histéricos dos patrões e funcionários da grande mídia sobre um suposto cerceamento de sua liberdade de imprensa referem-se única e exclusivamente ao exercício dessa mesma liberdade, só que agora por leitores e ex-leitores, cujo direito à expressão essa mídia jamais defendeu, sequer com um pio.
Idelber Avelar, colaborador do site – www.cartamaior.com.br