O CHILE DE HOJE PODE SER O BRASIL DE AMANHÃ

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Carlos Eduardo, presidente do Sindicato dos Bancários do Ceará


Não é novidade que o Chile está passando por uma grave crise, política, econômica e social. Temos visto nos noticiários dos últimos dias protestos da população violentamente reprimidos pela polícia e exército, saques nas ruas, assassinatos (já são 15 mortos) e perseguição aos manifestantes, entre outras questões igualmente graves. Um toque de recolher foi decretado. Mas aí, você se pergunta: o que isso tem a ver comigo, com o Brasil? Vejamos.


Inicialmente, é importante afirmar que a destruição da Previdência e dos serviços públicos no Chile estão na base da revolta de um povo maltratado, o que gerou um descontentamento dos cidadãos. Nos protestos, frases como “nos tiraram tanto, que acabaram nos tirando o medo”.


Durante a ditadura de Augusto Pinochet, o Chile inaugurou o neoliberalismo no continente. A reforma da Previdência, que o ministro da Economia, Paulo Guedes, ajudou a implantar lá e vem implantando aqui no Brasil, destruiu as esperanças da maioria dos chilenos de uma velhice digna. O regime ditatorial orientado pela política norte-americana conduziu às privatizações da mineração, do sistema bancário, dos serviços públicos de saúde, educação e transporte. A economia incluiu uma minoria próspera, enquanto à maioria da população relegou-se a informalidade, a pobreza e o desalento. Isso tudo aliado ao desdém de um governo que não tem a mínima habilidade em lidar com a situação.


Hoje, os chilenos pagam por serviços que precisam mais caro do que podem pagar, o país está imerso em uma enorme injustiça social, cultural, econômica e política. Os manifestantes veem que seus pais e avós recebem aposentadorias de miséria, na maioria das vezes, menor que um salário mínimo. A paciência do povo cessou.


Para financiar o custo da transição para o sistema de capitalização – o mesmo que o ministro da Economia, Paulo Guedes, quer adotar no Brasil –, uma das medidas foi cortar gastos em saúde, educação, moradia. Depois de 40 anos, percebeu-se que o sistema de capitalização individual empobreceu os idosos no Chile, a qualidade dos serviços públicos se deteriorou e nunca recuperou níveis de dignidade. A reserva que as pessoas fizeram com a capitalização simplesmente não é suficiente para pagar as contas, levando milhares de pessoas idosas a uma situação de penúria, ao desespero e, muitas vezes, ao suicídio.


Diante desse cenário catastrófico, diversos economistas estão considerando que a realidade chilena de hoje pode vir a se transformar no Brasil de amanhã. E considere-se também que os indicadores chilenos ainda são melhores que os brasileiros, basta ver que o salário mínimo correspondente no Chile é R$ 1.700,00, enquanto no Brasil é R$ 998,00. O maior problema do Chile mesmo é a péssima distribuição de renda. O governo do Chile acreditava, como o governo Bolsonaro, que o mercado resolve tudo. E quando o governo decidiu aumentar a tarifa do metrô, foi como acender um barril de pólvora. No Brasil, em 2013, o aumento das tarifas foi apenas o estopim para uma onda de manifestações, que acabaram servindo de pano de fundo para o golpe institucional de 2016 que derrubou a presidenta Dilma Rousseff.


Portanto, os protestos no Chile servem como um alerta para o Brasil, que padece não somente com a desigualdade absurda e crônica, mas com a pobreza crescente e os altos índices de desemprego. Vamos reagir para que essas situações não se agravem ainda mais e que a situação caótica presente hoje no Chile não se reflita no Brasil.