O inferno de Dante

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Os adeptos da leitura diária de jornais e revistas no Brasil vivem dias difíceis. Decerto que há exceções, mas são dias de terror. Todas as manhãs acordo com a ligeira impressão de que vou me deparar com as seguintes manchetes:

Veja – “Freira que deu chá a João Paulo I na madrugada da sua morte nega, mas foram encontrados panfletos do PT no seu hábito”.

Folha – “Lula, como sempre, diz que não sabe de nada, mas Berzoini encontrou-se com Bin Laden mês passado”.

Estadão – “Descoberto o mistério: Al Qaeda quer dizer PT em aramaico”.

IstoÉ – “Exclusivo: nomes de Lula e José Dirceu aparecem em lista encontrada na bolsa de Judas Escariotes, diz pesquisador do Vaticano”.

O Globo – “Encontrado, em fuga, militante do PT próximo ao Rebouças no dia do deslizamento”.

Jornal do Brasil – “Marcola fala tudo. PT saudações”.


No Brasil, a imprensa tem um comportamento similar ao da agroindústria da cana-de-açúcar em Alagoas. São poucas famílias que dominam o setor, e têm profundo desprezo pelo povo. Jornalismo é a única coisa que não praticam. Verdadeiras majestades, em geral, sempre contribuíram para o atraso da nação, repito, salvo honrosas exceções.


Nada contra o livre pensar. Nada contra ter a publicação qualquer, uma linha editorial definida, mas reduzir Ernesto “Che” Guevara a um simples “fedido” foi dose prá elefante, como o fez a Veja de algumas semanas atrás. Isso é o fato comprobatório do que realmente pensam: a plebe é “fedida”. PT cheira à plebe. Rude e ignara. A personalização da anátema.


A despeito dos equívocos e da timidez em tomar decisões à esquerda desse governo, ele é o mais republicano e democrático entre todos os que já tivemos desde 1889. O País cresce a 22 trimestres consecutivos, fato que há muito, muito tempo não víamos. E outro fator importante cresce com criação de empregos, com melhoria tímida, mas real, de distribuição de renda, consumo etc.


Mas nada disso adianta. E aí, tem o José Neumane Pinto, o Arnaldo Jabor, o Diogo Mainardi, o Clóvis Rossi, a Eliane Cantanhêde, o Carlos Nascimento, o William Bonner, o Ali Kamel, o Otávio Frias Jr. etc. Eles não preferem o passado, e sim que jamais fosse descoberto que é possível governar o Brasil com o mínimo de soberania. Que é possível fazer com que o povo coma três vezes ao dia. Que é possível uma série de coisas que diziam que não era. E quem possibilitou isso tudo foi um operário. É puro desprezo pelo povo!


O povo ainda não tem certeza absoluta, mas parece que está descobrindo que não somos vira-latas, e que o culpado disso tudo não é ele, o povo, e sim a aristocracia. É deles, da aristocracia, a tese que diz ser o Brasil um País que tem tudo para ser grande, mas não é porque o povo é pífio, vagabundo, não gosta de trabalhar, é desonesto. Aglomera-se em favelas pra praticar o crime, o tráfico de drogas, conspira contra a sofrida classe dominante, quer ter acesso ao que ela tem e isso é insuportável! O papel que cumpre a imprensa é reafirmar isso todos os dias, que a culpa é do povo! Eles têm um medo horroroso da democracia, e por isso são fascistas!


Por fim, deve lhes estar reservado o nono fosso do “Inferno” de Dante, onde os autores de escândalos, fofocas e heresias são esfaqueados sem cessar pela espada do demônio. Como já temos o DEM(O), vai ser fácil!

Sérgio Braga, secretário de Finanças da Contraf-CUT