O México foi uma vanguarda do neoliberalismo na América Latina. Dos primeiros a implementar esse modelo no continente, acompanhou essa adoção com a primeira adesão regional a um Tratado de Livre Comércio – o Nafta, assinado em 1994, com os EUA e o Canadá. Acreditou que iria rentabilizar ao máximo sua fronteira com a maior economia do mundo, distanciando-se de uma América Latina com perfil baixo nos anos 1990, e integrando-se definitivamente à América do Norte. Desde então, mais de 90% do seu comércio exterior se faz com os EUA, praticamente não tem comércio com a China e a Índia, e intercâmbios muito pequenos com a América do Sul – os eixos mais dinâmicos da economia mundial.
O livre comércio chegou sob a forma das indústrias de maquila, na fronteira norte, onde as corporações norte-americanas passaram a realizar as operações desqualificadas de suas empresas, usando mão de obra barata. A desnacionalização da economia chegou ao milho – alimento essencial para o povo mexicano –, quando o país passou a depender da produção e dos preços fixados pelos EUA.
O México é hoje um desastre social, econômico e político. O pior é que a esquerda mexicana não conseguiu se valer do fracasso do projeto de livre comércio das elites e foi sucessivamente derrotada. É certo que uma parte dessas derrotas se devem a fraudes eleitorais – contra Cuahutemoc Cardenas e contra Lopez Obrador. Mas é também certo que a esquerda não conseguiu construir uma sólida maioria nacional, que superasse – como em outros países – as fraudes e o monopólio privado da mídia.
Nas últimas eleições, o candidato da esquerda concentrou sua agenda no ataque à corrupção – inquestionável – no México, ao invés de centrá-la no modelo neoliberal. A tal ponto que o movimento organizado por Lopez Obrador recebeu o nome de Movimento de Regeneração Nacional. Tanto o PRI, como o PAN ficaram livres de responder pelo fracassado modelo econômico. Puderam, assim, se dedicar a outros temas, inclusive a violência e o narcotráfico.
A esquerda mexicana sofreu, assim, grandes derrotas, sucessivamente, primeiro contra o PRI, depois contra o PAN e, agora, de novo, contra o PRI. Como é típico das derrotas, ela aprofundou a divisão na esquerda, com Lopez Obrador saindo do PRD para fundar um novo partido, o que se soma à existência dos zapatistas, os quais, mesmo com perfil muito baixo, seguem na sua luta. São pelo menos três forças distintas, que não atuam de forma unificada, não permitindo prever um desempenho mais favorável da esquerda nas eleições regionais e na presidencial.
É como se setores da esquerda mexicana apontassem na mesma direção dos EUA, que busca separar cada vez mais o México do resto do continente. Depois de uma longa trajetória de apoio às forças progressistas latino-americanas, a esquerda mexicana foi se afastando dos processos políticos do continente, justo quando, pela primeira vez, na América do Sul, convive importante quantidade de governos progressistas.
Emir Sader – Sociólogo e cientista, mestre em filosofia política e doutor em ciência política pela USP