Assim como para a Globo os inimigos do passado eram aqueles que se insurgiam contra a ditadura que seqüestrou, torturou e matou milhares de brasileiros, hoje os terroristas são aqueles que lutam contra as multinacionais que roubam o patrimônio público, danificam o meio-ambiente e produzem graves problemas sociais.
Poucas vezes uma reportagem foi tão distorcida quanto a do Jornal Nacional do dia 9 de abril a respeito do MST. Nos dois minutos e vinte e quatro segundos da matéria busca-se a criminalização dos camponeses; para tanto, imagens e palavras são cuidadosamente articuladas para transmitir ao telespectador a idéia de que os militantes do MST é quem são os responsáveis por todo o medo que ronda os paraenses.
Logo na abertura da matéria, o fundo escurecido por trás do apresentador exibe a sombra de três camponeses portando ferramentas de trabalho em posições ameaçadoras, como a destruir a cerca cuidadosamente iluminada pelo departamento de arte da emissora. Quando os militantes aparecem nas imagens, estão montando o acampamento e utilizando folhas de palmeiras – naturalmente já arrancadas das árvores. Quando a matéria corta para ouvir a opinião de um empresário local, ele tem ao fundo exatamente uma folha de palmeira, só que firme no solo – e vistosa, viva.
O representante da Vale do Rio Doce é o que tem mais tempo para se manifestar, tanto tempo que até gagueja – e balbucia: “esses movimentos… estão [nos] impedindo de trabalhar”. Em nenhum momento os representantes do MST são ouvidos, o que contraria, inclusive, as próprias regras do jornalismo. Mas quando os interesses comerciais de empresas amigas estão em jogo, no caso a Vale do Rio Doce, tudo indica que essas regras são postas de lado.
Esta falsa preocupação do Globo com a defesa do povo brasileiro não é de agora. Assim como para o “Globo” os inimigos do passado eram aqueles que se insurgiam contra a ditadura que seqüestrou, torturou e matou milhares de brasileiros, hoje os terroristas são aqueles que lutam contra as multinacionais que roubam o patrimônio público, danificam o meio-ambiente e produzem graves problemas sociais. É exatamente por isso que ao interromper o fluxo de exportação de uma dessas empresas os militantes do MST acertam em cheio no sistema nervoso do capitalismo.
Dotados apenas de enxadas e coragem, os sem-terra enfrentam jagunços armados, policiais e poderosos grupos de comunicação – esse coquetel que tem como objetivo massacrar o povo organizado. Assim é que os militantes do MST ensinam ao povo brasileiro: não é uma luta justa, mas é uma luta que pode ser vencida.
Por outro lado, o jornalismo das Organizações Globo mais uma vez revelou seu caráter covarde e submisso. Aliou-se aos poderosos e rasgou o juramento profissional da categoria. Mas não há de ser nada. A História vai se ocupar de reservar a cada qual seu devido lugar.
Marcelo Salles, editor do jornal Fazendo Media
(www.fazendomedia.com)