Pelo fim da cultura do estupro! A culpa não é da vítima!

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“Mas também, só usa roupa curta, queria o quê?”. “Ah, mas ela se insinuou, deu nisso!”. “É minha mulher, eu uso quando e do jeito que eu quiser”. Por incrível que pareça, em pleno ano de 2016, esses são pensamentos usuais e corriqueiros por todo o Brasil, configurando uma verdadeira “cultura do estupro”, culpando sempre a vítima por um crime que ela não causou.


Em maio passado, o caso da adolescente Beatriz, no Rio de Janeiro, estuprada por 33 homens, que ainda filmaram o ato e postaram nas redes sociais, vangloriando-se do feito, ganhou o Brasil e o mundo e trouxe o assunto para o centro do debate.


De acordo com os dados mais recentes, em 2014 o Brasil tinha um caso de estupro notificado a cada 11 minutos. Os números são do 9º Anuário Brasileiro da Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em tempo, outra pesquisa do Ipea, realizada em 2013 e divulgada em 2014, mostra que 26% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a informação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. No entanto, 58,5% concordam total ou parcialmente com a afirmação que “Se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros”.


Outro dado assustador, dessa vez do Sinan (Sistema de Informações de Agravos de Notificação), mostra que 24,1% dos agressores de crianças são os próprios pais ou padrastos e 32,2% são amigos ou conhecidos da vítima. 70% dos estupros, de uma forma geral, serão cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, o que indica que a violência está mesmo dentro dos lares, demonstrando que o estupro está vinculado à uma cultura machista e misógina, que entende que o homem tem direito de ferir e dispor da mulher como bem entender.


Na cultura machista, os homens crescem em um meio com muito mais liberdade do que as mulheres, geralmente reprimidas em suas escolhas, das roupas às atitudes. Nesse cenário, predomina a visão de que cabe a mulher não se expor ao perigo, abusando de sua sensualidade. Já o homem é visto como um ser indomável, incapaz de se controlar se uma mulher estiver de saia curta.


Protestos – O caso da adolescente Beatriz ganhou a comoção e a solidariedade das redes sociais, que foram inundadas de campanhas contra a violência sexual contra mulheres. Fotos de perfis foram cobertas com frases como “Precisamos falar sobre a cultura do estupro” e “Eu luto pelo fim da cultura do estupro”. Em outra campanha, a imagem de uma mulher sangrando, pendurada como Jesus à cruz, era disseminada nas redes. Usuários ainda compartilharam mensagens como “Não foram 30 contra 1, foram 30 contra todas. Exigimos justiça!”


E os protestos saíram da internet e ganharam às ruas. No dia 1º/6, em várias capitais do País, mulheres de várias entidades sindicais e movimentos sociais/populares organizaram atos contra a cultura do estupro. Em Fortaleza, o evento aconteceu na Praça do Ferreira. Entre todas elas, um só pensamento: não importa se há um relacionamento afetivo, se conhece a vítima há muitos anos, se usa roupa curta ou anda em ambientes com muitos homens, se a vítima não morreu ou não foi espancada. Se a relação sexual é feita sem consentimento da mulher, é estupro, sim! E a culpa, definitivamente, não é da vítima!


Essa luta não é só das mulheres…

Foi com horror, repugnância e profunda tristeza que tomamos conhecimento do crime ocorrido no Rio de Janeiro, com uma jovem de apenas 17 anos. Ela foi barbaramente violentada por mais de 30 homens, que ainda tiveram a desfaçatez de expor o próprio crime nas redes sociais, para se vangloriarem e por certo, crentes na impunidade que lhes confere a sociedade machista, misógina e patriarcal. É comum procurar justificar esse tipo de violência colocando a culpa na vítima e isso precisa parar. A culpa é do criminoso e a sociedade não deve mais tolerar isso. Chega de violência contra a mulher, chega de aceitar as desculpas e justificativas, pois são essas mesmas que fortalecem a cultura cruel e desumana do estupro. Não basta dizer que é contra, é preciso ter atitude, rejeitar o comportamento que relativiza a questão. Nunca a culpa é da vítima. Essa luta não é só das mulheres, ela precisa ser de todas as pessoas de bem
Rita Ferreira, diretora da Secretaria da Igualdade e da Diversidade do Sindicato dos Bancários