A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quinta-feira (26), a criação de uma renda mínima emergencial de R$ 600, durante três meses, para trabalhadores informais, autônomos, desempregados e microempreendedores afetados pelo coronavírus. Para famílias com dois ou mais trabalhadores e mães solteiras, o valor será de R$ 1.200. Aqueles que não têm filhos receberão os R$ 600. A medida deverá alcançar 24 milhões de pessoas. O governo havia proposto inicialmente R$ 200 por pessoa. Com a derrota previamente sacramentada, o governo autorizou seus líderes a negociar o valor aprovado.
A proposta será avaliada agora pelo Senado e, se aprovada, precisa ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em um prazo de 15 dias após a última votação para que entre em vigor.
Pelo texto aprovado, o benefício será destinado a trabalhadores maiores de 18 anos que não sejam titulares de benefício previdenciário ou assistencial, bem como de seguro-desemprego. Outros critérios acompanham a decisão. O recebedor deverá, por exemplo, ter renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar mensal total de até três salários mínimos, não podendo ter recebido, em 2018, rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70.
Pessoas que recebem o Bolsa-Família têm direito, mas não tem direito quem recebe outros benefícios previdenciários ou assistenciais.
Juvandia Moreira, presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), lembrou que as negociações foram intensas nos últimos dias, tanto das organizações e movimentos sociais, como entre parlamentares, com destaque para o trabalho das centrais sindicais. “A pressão coletiva e popular de todos que se mobilizaram pela campanha ‘Renda Básica que Queremos’ fez toda a diferença. É uma vitória de mais de 500 mil cidadãos e mais de 150 organizações/movimentos”, afirmou.
Para Juvandia, o texto aprovado não é o ideal. “Há dois pontos que precisamos pressionar para mudar no Senado: ampliar a duração para 6 meses e incluir as pessoas de baixa renda que tenham emprego formal, mas estejam sofrendo reduções de salário e jornada”, explicou.
“De qualquer forma, o que já conseguimos até aqui é um enorme avanço. Além de todos os auxílios para a população, mostra como a união da sociedade para pressionar faz a diferença. Conseguimos um resultado que é muito melhor do que a proposta originalmente apresentada pelo governo”, finalizou.
Papel do Estado
Para o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), este é o papel do Estado em meio a crise. “Liberar recursos fiscais ilimitados para o atendimento de saúde preventivo e curativo, liberar recursos para garantir renda para as pessoas com proteção do emprego e liberar recursos para capital de giro das empresas com juros subsidiados. Além de liberar recursos para retomada de investimentos públicos para mobilizar a saída da crise. Para ter recursos, criar um Fundo de Emergência Fiscal, tributando os ricos e a riqueza e dando nova ordem de prioridade para os gastos fiscais. Tudo é Estado, capacidade fiscal e coordenação de ações e iniciativas”, disse.
Vitória das Centrais
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) e as demais centrais sindicais passaram os últimos dias em reunião com o Supremo Tribunal Federal (STF) e com o Congresso para discutir como fazer o enfrentamento à crise sanitária e econômica decorrente da pandemia do novo coronavírus (COVID-19) de forma séria e humanitária. Na pauta, foram debatidas medidas urgentes para proteger o emprego, os direitos e a renda da classe trabalhadora.
“O papel das centrais sindicais é fundamental neste momento para preparar a saída dessa crise”, afirmou Sérgio Nobre, presidente da CUT, ao destacar a importância da pressão dos movimentos populares, no momento “em que falta diálogo no país”, em que o governo federal edita medidas provisórias sem dialogar com as instituições que representam a sociedade.
Negociação
A aprovação resultou de um acordo feito após intensas articulações envolvendo todos os grupos políticos da Casa. O debate partiu de uma proposta feita pelo governo de que o auxílio fosse de R$ 200.
Ao longo dos debates, diferentes membros da oposição se queixaram da relutância de membros do governo em aprovar o texto. Os partidos que compõem a minoria (PCdoB, PDT, PSB, PSOL, PT e REDE) haviam apresentado uma proposta que estabelecesse um mínimo de R$ 1 mil para o benefício, mas a sugestão não foi acatada pelos aliados do Planalto, que entoaram o discurso de necessidade de contenção dos gastos.
“Esta é uma fase em que precisamos ter serenidade, equilíbrio e responsabilidade”, disse, por exemplo, o líder do governo na Casa, Major Victor Hugo (PSL-GO).
Para a presidenta do PT e vice-líder da bancada do partido, Gleisi Hoffmann (PT-PR), faltou interesse e planejamento da gestão Bolsonaro para lidar com a demanda. Assim como outros parlamentares, ela ressaltou que muitos trabalhadores acabam se expondo aos riscos da infecção por coronavírus em busca de sustento por não poderem manter um recolhimento em casa durante a crise, com destaque para aqueles que vivem na informalidade.
“Nós não podemos expor as pessoas a decidirem entre o vírus e a fome. Este país sabia desde dezembro que nós iríamos ter a crise do coronavírus. O governo foi avisado, foi alertado. Por que não tomou as providências? Por que esperou?”, questionou a petista, ao defender um auxílio de valor mais alto.
A proposta será votada no Senado a partir na segunda-feira (30/3).